Doações de empresas provocam cassação de mandato de Pezão e Dornelles
Chapa do governador e do vice recebeu doações de empresas na campanha eleitoral de 2014, que fizeram contratos com o governo
A ‘troca de favores’, como receber doações de campanhas de empresas e garantir vantagens a elas com o Estado — hoje atolado em denúncias de corrupção e falta de gestão — tirou do eixo a chapa do chefe do Palácio Guanabara, Luiz Fernando Pezão, e do segundo homem mais forte do Executivo, Francisco Dornelles. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) decidiu nesta quarta-feira, por três votos a dois, cassar os mandatos do governador e do vice. Entre as denunciadas, estão as construtoras Queiroz Galvão e OAS Engenharia, envolvidas nos escândalos de pagamento de propina da Lava Jato. Pezão e Dornelles foram condenados por abuso de poder econômico e político.
A condenação os torna inelegíveis por oito anos. Foram gastos mais de R$ 10 milhões com gráficas inexistentes, segundo Marcelo Freixo, do Psol, autor do pacote de denúncias ao TRE. Pezão garantiu ao DIA que não faltam argumentos para derrubar a decisão. “Meus advogados têm muitos”, comentou, sem entrar em detalhes sobre sua defesa.
A Corte determinou que sejam realizadas eleições diretas para a escolha dos novos representantes. A decisão, no entanto, produz efeito apenas quando não houver mais direito a recurso. O caso deve parar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília.
“Restou comprovado que contratos administrativos milionários foram celebrados em troca de doação de campanha”, afirmou um dos membros do TRE, desembargador eleitoral Marco Couto, em seu voto, lido na sessão.
Menos de um mês antes da eleição de 2014, a Ipê Engenharia, que doou R$ 1 milhão para a chapa, foi agraciada com um reconhecimento de dívida de R$ 5,2 milhões. “Fato curioso (…) é que ela se refere a um valor supostamente devido desde o mês de agosto de 2013, mas que somente agora (2014), no curso do pleito eleitoral, veio a ser saldado, o que, sem sombra de dúvidas, pode ser uma causa motriz atrelada à doação de campanha que veio a se consumar poucos dias depois”, escreveu na ação o deputado Marcelo Freixo.
Para a advogada do Psol, Samara Castro, os pontos principais para a derrota de Pezão e Dornelles foram os contratos firmados com o estado e as isenções fiscais concedidas. “As doações eram legais à época, mas foram usadas como moedas de troca espúrias para acordos contratuais e benefícios fiscais”, declarou.
Na ação consta que a Queiroz Galvão doou R$ 1,5 milhão para o comitê financeiro do PMDB e R$ 255 mil para a chapa Pezão e Dornelles, em 2014. E ganhou no mesmo ano o pagamento do governo no valor de R$ 99,2 milhões.
A construtora Colares Linhares S.A. foi outra beneficiada. De abril de 2014 até agosto, quando Freixo entrou com a ação, ela firmou contratos que chegaram a R$ 15 milhões com o governo estadual. Na campanha, foi solidária: doou R$ 1 milhão para Pezão e Dornelles.
Podem até chegar ao fim do mandato
A decisão do Tribunal Regional Eleitoral criou estardalhaço, mas Pezão e Dornelles podem terminar os mandatos à frente do governo. Isso porque, cabe recurso no TRE e ainda no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“Tem casos no TSE desde 2008 que ainda não foram julgados. Então, o governo pode acabar e simplesmente o caso não ter sido julgado”, afirmou Luiz Paulo Viveiros de Castro, advogado especialista em Direito Eleitoral.
Segundo ele, há dois instrumentos de defesa possíveis, o embargo de declaração, para explicar dúvidas no acórdão (decisão colegiada) no TRE, e o chamado recurso ordinário, que vai direto para o TSE. Em nota, o Palácio Guanabara informou que, quando for publicada a decisão, o governador Luiz Fernando Pezão e o vice-governador Francisco Dornelles vão entrar com recurso direto no TSE.
Agora, os políticos vão ter que aguardar a publicação do acórdão. Em média, acontece no prazo de três dias a uma semana. “Depois disso, há três dias de prazo para a defesa atuar, protocolar os recursos”, esclareceu Luiz Paulo Viveiros de Castro.
A sessão de julgamento dos políticos foi tensa. Cinco membros votaram. A advogada Fernanda Tórtima, que integra a Corte, não quis votar. Alegou que advoga para uma das empresas envolvidas no caso. A ação tem 24 mil páginas com dados sobre as empresas, valores de doações e benefícios fiscais.
Problemas de Pezão repercutem na Alerj
Quando a informação da cassação começou a circular, no início da noite, os deputados estavam prestes a iniciar uma sessão na Alerj. Em entrevista ao RJTV, da TV Globo, o presidente da Casa, Jorge Picciani (PMDB), disse que espera pelo sucesso de Pezão e Dornelles na hora da decisão do TSE. Ele torce para que a cassação não atrapalhe a discussão de medidas como a privatização da Cedae. “Mas evidentemente que é um enfraquecimento político. É mais um ingrediente nessa grave crise por que passa o Estado do Rio de Janeiro”, assumiu Picciani. A privatização da empresa começa a ser discutida hoje pelos parlamentares.
Para o deputado Carlos Osório, do PSDB, que faz oposição ao governo, Pezão e Dornelles ficaram em um xeque-mate. “Coloca o governo numa situação impossível. Não tem mais condições de governar. O que a gente (PSDB) cobra agora é uma decisão rápida para convocar novas eleições”, declarou Osorio.
O deputado Luiz Martins, do PDT, disse que não ficou surpreso com mais esse revés do governo. “Nada mais me surpreende, mas acredito que a Casa vai esperar o desfecho final do caso na Justiça”, analisou. Marcelo Freixo voltou a frisar as denúncias feitas ao TRE e pediu eleição. “Na época, percebemos que caracterizava abuso de poder político e econômico. Por lei seria eleição indireta. Direta é uma opção mais democrática”, defendeu o deputado Marcelo Freixo.